"(...) a mentira sincera
brincadeira mais séria
que me aconteceu..."
Outra vez
Il, escrevo para te dar uma boa nova. Fui convidada para realizar a curadoria de um edital na secretaria de cultura. Fiquei honrada e feliz, mas não espalhe por aí. Acho que alguém me descobriu e está disposto a jogar um jogo perigoso comigo ou, quem sabe, com alguma sorte me enlouquecer.
Existe um romance que está concorrendo ao prêmio intitulado "Cartas a Il". A autoria é de uma brejeira, interior de Goiás. Coisa mais linda nunca vi. Além do texto ter um sabor interiorano, marcado por artifícios de linguagem próprio aos pantaneiros, a compilação do material só pôde ser feita após a morte da autora.
Pelo que consta ela era uma subversiva da forma e, embora escrevesse compulsivamente, recusava-se a enquadrar o material. Levava a vida como artesã. Trabalhava com o couro dos jacarés do brejo.
Ainda que seu trabalho fosse um tanto rústico, o texto da moça se desenvolveu de maneira incrivelmente refinada. Há indícios, em alguns trechos, de que ela era avisada quanto à potência de sua escrita. Por que se recusava à publicação do mesmo?
Os outros curadores especulam acerca da existência desse tal Il, espécie de um amor que precisava se manter escondido. Eu não me perco nisso, porque apesar do título identificar a narrativa como sendo epistolar, há uma inscrição da autora no começo de um de seus cadernos apontando o gênero "Romance", grafado em itálico. A sofisticação literária, a meu ver, fica por conta disso. Ela alarga a fronteira do gênero romance, inaugurado por Cervantes no século XVII.
Não é coincidência demais o fato de que no pantanal também tenha nascido uma compilação de cartas a Il? Estou um tanto desbaratinada com essa história. Estive no pantanal em 2011 e estou disposta a voltar depois dessa pérola. Por que publicar aqui, algo que nasceu lá? Você viria comigo nessa viagem investigativa?
Aguardo sua resposta. Não tenha pressa. Estou atolada de trabalho. Preciso organizar tempo para isso. Te mando uma cópia do texto pra você ir se inteirando devagarinho. Não espalha. É sigiloso.
Com amor e sem urgência,
L.
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