domingo, julio 18, 2010

mais perto do que se pode imaginar


um homem um dia sonhou uma filha que não fora sonhada pela mulher que a concebeu
um pai certa vez sonhou uma menina
e sendo tão sonhada por ele, a menina podia até virar, quem saberia dizer, uma grande mulher

a menina depois de grande queria ser amiga dela
queria conversar com ela
saber do que gostava, do que chorava e por onde pensava que podia caminhar,
mesmo sabendo que a estrada é cheia de surpresas
[não há mal nenhum em sonhar uma estrada]

pensou e escreveu uma carta à caneta dourada
disse que não se magoava por não ter sido sonhada por ela
que os sonhos de uma pessoa conhece razões
que a própria razão desconhece
que não se sentisse endividada
que, se observasse bem, também ela havia sonhado uma estrada
muito calma, muito bonita, de muita sabedoria
uma estrada diferente para ela

quase não se entendiam em palavras
e enquanto uma presenteava a outra com saias
a outra respondia com trabalho duro, com trabalho de "macho"
e sem se corresponderem
mantinham-se profundamente ligadas,
unidas por oposição

1 comentario:

Anónimo dijo...

um homem que sonhava uma filha, que sonhava uma mãe, que não sonhava ninguém.

um homem que sonhava uma filha, que sonhava uma mãe e sonhava toda a quadrilha. (...ou família).

Achei Drummond puro! (o que, óbvio, é um tremendo elogio).

Pensar a mãe como mulher, ainda por cima passível de falha, é demais para os meus textos. No fundo da minha cabeça, minha mãe deve ter nascido junto comigo, e com essa função. Ou melhor, funções a partir daí: parir, acolher, alimentar, ensinar, sofrer, contar e sentir saudades.

Talvez eu aperfeiçoe essa concepção quando tiver mais perto de ter os meus filhos... aí poderei escrever bem como você sobre pais, mães e filhos.