por uma teoria

ela é apaixonada por ele

ele é apaixonado por mim

e eu nessa de escrever pra tentar encontrar um novo ponto de encantamento, tentando me apaixonar por uma idéia nova nesse momento, uma teoria, um caminho. Tentando criar uma teoria para mim, porque as coisas se deram comigo assim.

É muito bom poder não ter nenhum compromisso com a verdade aqui. Fingir que a ficção que agora escrevo pode até se aproximar um pouco do que eu julgo ser a verdade, mas sem tanta responsabilidade. Poder supor! Criar hipóteses malucas!

Sou fiel à verdade que inventei e por isso não publico meu outro caderno, que julgo mais interessante e consistente do que esse. Quando digo “eu” por aqui e você acredita, por detrás da coxia eu morro de rir. Quando se aprende a mentir é a verdadeira libertação. Mas reconheço que só é possível fingir até um certo ponto. Para mim, seria difícil me espelhar em Ana Lúcia Boechat, conforme já falei num outro momento ou, quem sabe, aquela minha tia que foi para o convento. Isso eu já tentei e não consegui. Não pude conseguir, porque em minha teoria nova que estava sendo gestada desde aquela época não cabia espaço para um eu comportado, fechado, introspectivo, leitor de todos os lados. Foi essa desordem interna, esse jeito atrapalhado de chegar aos lugares, de dizer um pouco mais do que cabe, esse estilo que mistura fanfarronice com delicadeza, o princípio de uma teoria que se inventa e se esgarça, que se mostra e se vela, que faz “eu” perceber que existem milhões de possibilidades incríveis entre o sim e o não, entre um homem e uma mulher, entre a verdade e a mentira, a minha teoria

que faz com que ele se apaixone por mim

e que ela se apaixone por alguém já apaixonado

por outro alguém que só pensa em se apaixonar por uma teoria que diga a verdade, ainda que para alcançá-la tenha que falsear tantas e tantas vezes, tenha que fracassar e se levantar com o joelho ralado, apontando a marca que ficou da queda, mas com a cabeça erguida sempre procurando uma boa e nova idéia que a apaixone novamente, que a faça viver.