Devagar se vai ao longe. Supondo se vai ao infinito. Quanto a mim, efetuo cortes via palavra, essa faca amolada. Recorto um lugar para o inaudito com a finalidade, acredito, de não morrer em desenquadre, de não morrer de pós-modernidade.
Agora estou novamente sozinha. Com o instrumento devidamente afiado treino golpes, os mais diversos, estudo etimologias, me perdoo de ter desejado sentido, que ninguém é de ferro.
A propósito, adquiri um turquês de roldana e com afinco me aplico no exercício. Primeiro pastilhas de vidro, depois britas, quem sabe um dia racho a pedra numa litera tura. Dura essa letra até em latim. Minha miséria e meu destino. Meu ofício com as palavras.
As mãos ficaram calejadas, foi um esforço insano de me esquecer, ter alguma paz.
Seria eu diferente dessas pessoas que aguardam redenção dos que supostamente suportam amar? Quem ama não perdoa, que ama, ama. Descoberta a culpa, essa mal amada, limpo com paninho e águarrás. Logo depois da faxina, a asma é um sintoma bonito até, uma sequela que fica, uma marca incurável das tantas que portamos. Doença crônica, sem cura, mas com tratamento. Doença de difícil controle. O médico faz poesia com o que diz e nem sabe.
Respondo, resignada, que se fosse fácil, não aconteceria comigo. Essa obsessão em me desafiar o tempo inteiro, testar limites. Ele me olha com cara de grande besteira. Do alto de meu escópico, sagaz para curtas distâncias, lhe subtraio o esteto. Insisto, turrona, letra dona, ofereço poesia ao seu olhar técnico que se desconserta finalmente, que me desentende.
Desoriento um hospital inteiro com amor. Sempre com muito amor. Peço desculpas pela dificuldade sintomática que me imponho. Ele sorri, esperto, devolvendo que se fosse fácil, provavelmente eu não o encontraria, explica que é especialista em desamparo grau agudo, que eu não poderia ter parado em melhores mãos.
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