viernes, noviembre 21, 2008

Diário de campo: sobre a produção do poeta na cirúrgica

Faço sonhos que exigem serem descritos, mas tudo o que consigo, não sem algum esforço, é que eles sejam escritos e, eventualmente, lidos. Tenho me perguntado acerca do que sou diante de tudo e o que posso recortar de mim nesse momento é alguma retidão diante do que quero, da parte que posso querer da vida que insiste agora.

  • Sem qualquer pretensão e é por clicar na tecla errada possuo agora um texto em marcadores e numerações. Errado é crer no clique errado. Aqui estou seguindo o fluxo que me é colocado. Humildemente sou um pedaço de vida solitária nesse momento onde o frio gela qualquer carne que após um banho surpresa de chuva pode se permitir quando vem o vento. Meu marcador é um marca-passo.
  • Hoje vi um rim vivo sendo transplantado de uma irmã para um irmão, posso também dizer que a carne da irmã penetra incestuosamente a de seu irmão. Difícil arrancar de suas gordurosas carnes o filtro precioso, mas tão fácil para ele receber da irmã um pedaço de carne e me pergunto então porque para um homem é mais fácil ser fodido de carne do que para uma mulher? Eu não entendo a vida.
  • Chacotas que vêm de toda a parte e se mostram a melhor maneira de atravessar esse momento. O meu momento é enorme e cuido para que não escape de mim o sentimento que me move a escrever o que nunca poderá ser escrito. Mas, o sentimento ele é todo meu e está aqui.
  • Gosto de sentir a minha presença enchendo a sala de trabalhadores eminentemente homens, trabalhadores que fazem, entre outras coisas, cirurgias de troca de sexo: homens que castram homens e os tornam mulheres (?). Eu quase choro por não conseguir segurar para mim o tempo que tudo diz. Um homem amputando o pênis de outro pode ser a coisa mais linda que já tive na vida
  • "Quero casar e ninguém me quer" pensou a moça que vi completamente nua e ensaboada pelas mãos de um doutor, levantavam-lhe respeitosamente as pernas e do vidro pude ver sua boceta que me via de uma sonda que lhe penetrava. Tudo naquele lugar era por demais belo: não via quem não queria. Eu vi tudo com os meus próprios ohos e posso lhe assegurar que era assim. Talvez, não belo, mas sublime.

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