martes, junio 18, 2013

Elogio ao desconserto


Ato III

Quando eu disse que seu silêncio me desconsertava, você enrubesceu, não gostou, quis ir embora. Ponderei você ter escutado um desconcerto no lugar de desconserto, te chamei de volta, olhe, na verdade eu disse um s e não um c. Desconsertar é bom, mas você não quis saber.

Eu fiz um elogio ao desconserto. Estava sendo bonita no ato de me deixar invadir por uma música nova, a sua, bobo.

Você não deve ter percebido, entenda, não sou dada a formas bem delineadas. É uma pegada sombreado a que insiste. Pincel de esfumar que comprei. Logo eu que pintava com traço firme. Esqueci, gostei de esquecer, no tumulto de uma música que me atravessou, já faz um tempo, deixa para lá, eu não sei cantar mais.

Essa música me acordava toda... No entanto, existem outras que ainda lembro e canto baixinho no chuveiro pra não incomodar quem gosta de afinação, de harmonia, de concerto.


Desconserto

Ato I

Minha mãe me acordava contando que nós éramos as cantoras do rádio, que levávamos a vida a cantar, que a noite embalaríamos seu sono e que de manhã iríamos te acordar tarãrãtãtã... Era colorida essa minha mãe. De flúor.

Qual a música sua mãe cantava para você?


Ato II

Meu pai também cantava, acompanhado de violão, a história de um marinheiro, um marinheiro só. Curioso de quem tinha ensinado a ele. O tombo do navio? O balanço do mar?

Quem te ensinou a nadar?


Ato IV

Se meu petroleiro afundar mesmo, vai que afunda, vou me agarrar nessa do marinheiro só com força, nessa da necessidade que faz o sapo pular, sem deixar para trás a música que me faz acordar e eram desses silêncios que eu te falava

Todos os silêncios que me compõem

são feitos desses silêncios outros que me ofertaram

essas vozes que me cantavam, me cantam

em quase tudo

onde balanço

seu silêncio vibrando nos meus

eu danço

(é um tombo que não mata
é embalo de sono)

eu sonho

em quase tudo

onde balanço

é pai e mãe

                                                         

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