viernes, marzo 03, 2017

autre-biographie


"Todo verbo que é forte se conjuga no tempo"


Ele esperou eu ficar sozinha no mar. Foi quando meu irmão saiu de perto, me chamou pelo nome e perguntou se era eu que tinha ligado para casa dele perguntando por uma tal de Amanda, fingindo ser um trote. Eu disse que sim, que precisava ouvir a voz dele naqueles dias, mas que isso já fazia tempo. Não quis saber como eu descobri o telefone, mas perguntou se eu ainda tinha interesse na voz dele ou se era uma coisa daquela época. Eu falei que precisava pensar um pouco, pois o tempo já havia passado, que eu ponderaria e falaria com ele depois. Ele consentiu. Me deu o tempo que eu precisava. Na sexta eu voltaria para a casa da praia com a resposta, mas eu não apareci. Passei os dias que se seguiram na cidade, ouvindo o disco novo do cidade negra que meu tio do Rio trouxe de presente no natal de 1996. Eu me sabia apaixonada e não quis executar logo o que se daria dali a um mês. Precisava da distância, precisava alimentar aquela febre no meu corpo de adolescente durante tardes infinitas. Eu ouvia o disco no repeat e pensava nele, na ideia que eu fazia do que ele era, ideia que se espatifou logo no primeiro dia de aula quando ele foi estudar na minha escola e mudou da oitava B para a oitava A e escolheu uma cadeira ao meu lado. Ele competia com as aulas que eu tanto me entregava. Era impossível estudar diante daquela presença tão devastadora. Tive ódio. Terminei ali mesmo, da pior forma, meu romance de verão. A gente podia ter namorado. Podia ter sido amigo, pelo menos, mas eu encaminhei tudo sob o peso da inibição de uma menina que ia dar o primeiro beijo. Era o primeiro beijo dele também, mas acho que ele nem sofreu. Eu sim por achar que ele estava machucado. Eu precisava me manter sofrendo de amor como fiquei durante o ano anterior, entre um verão e outro, sem vê-lo, porque a gente morava longe, só se via nas férias e eu não sabia o nome dele, nem onde morava e nem o telefone. Depois dei meu jeito. 


Fico pensando em procurá-lo qualquer dia desses e reparar qualquer possível dano, o dano por ter tido apenas 13 anos e não saber encaminhar aquelas coisas, como não sei muito bem até hoje, como não devia estar culpada agora por depois de tanto tempo ainda amar no molde febril. 

Embora de lá para cá muita coisa tenha mudado - ele se casou, teve filhos, se tornou um empresário bem sucedido do ramo da construção e nem deve se lembrar de mim - eu ainda não me perdoei por ter sido uma menina de 13 anos com toda a dificuldade que é ser uma menina de 13 anos.

Se leio esses diários onde escrevi a passagem da minha infância para a adolescência com direito à menarca, visceralidades, descrição das ligações para a rádio da cidade de madrugada onde eu pedia música para ele sob um falso nome, músicas de Toni garrido, poesias, colagens, brincadeiras de amor real, onde através da data e do meu nome e do dele eu conseguia extrair a porcentagem de amor do dia, se registrei isso tudo para o futuro, como eu mesmo profetizei na contracapa de cada caderno (cinco completos no total) era só para me lembrar, hoje, que é na falta que consigo caminhar melhor, é quando reconheço minha vulnerabilidade e me abro ao outro que evoluo. É quando me sei curiosa e incompleta que posso abrir matas fechadas e caminhar com alegria. É para isso que escrevia, para me constituir em companhia pro que me tornei hoje, eu sabia de algum modo que precisaria de minhas próprias palavras num tempo futuro, espécie de bálsamo, para quando eu estivesse perdida experimentando outras versões de mim. Como faço agora com insistência, nesse caderno virtual, imprimido meus códigos secretos que só eu saberei decifrar em uma futura passagem difícil. Elas existirão. Viver é dureza.

Nesse exato momento, exerço te adotar de novo e mais uma vez. Sobreviva ao que for. Volte sempre que precisar. Tem café, o chá de limão que você tanto gosta e o opióide para sua dor de coluna. Os lenços ao alcance da mão. Ninguém vai te julgar, se você se emocionar com essas falsas memórias.

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