domingo, noviembre 11, 2018

recreio


Alan me ligou de um número desconhecido e, surpreendentemente, atendi. Assim que ele se apresentou já mandei um porra, Alan, por que você não me mandou uma mensagem antes? Ele disse que ficou com medo de eu não querer falar com ele. Na ligação, perguntou o que eu estava vendo da janela do trem e eu disse que não estava dando para olhar janela nenhuma, porque era hora de seguir em retidão, sem muita poesia. Estava cheia de prazos e desgostos, embora uma novidade se constituísse. Ele me perguntou sobre o lúpus e eu expliquei que estava regredindo, mas Alan sabe o quanto os corticóides me deixam mal-humorada. Vi que ele queria assistir a vida na janela comigo e só conseguiu dizer porra, você é foda, seu mal é esse, quando eu disse que andava em retidão. Há dias sem conseguir escrever, depois que acordei desse sonho com Alan, alguma coisa destravou em mim. Não perguntei por que Alan mudou o número de telefone e eu também não apaguei da minha lista o velho que agora apresenta a foto de um matagal com os seguintes dizeres at work. Vai entender... Alan é cheio de história. Ele diz que é antigo, por isso prefere ligar e não mandar mensagem. Eu digo que eu também sou antiga, mas que me adaptei. Explico para ele que é preciso, minimamente, dançar conforme a música. Mas, Alan, se adianta em deboche e diz minha querida, quem faz a música sou eu. Ele também costuma achar que eu tenho sempre o dobro de anos a menos do que eu realmente tenho dele. Acho que é um jeito de me infantilizar, de me tornar mais possível. Antes de desligar, tive tempo de dizer que se, da próxima vez, ele aparecer com esse sotaque ridículo, desse povo que se acha superior a nós, que vou desligar instantaneamente. Saindo do primeiro dia de resfriado, consegui ligar o computador e escrever um texto, meio mequetrefes, mas que já me libera para o feriado sem tanta culpa. Obrigada, Alan.

No hay comentarios: